Da primeira montação de brincadeira para hostess de balada, sets e pop e funk, até migrar pro tribal. Conheça a drag DJ Sophia Mel.
De dia, Dr. Bruno Avelino. De noite, Sophia Mel. Artista do Rio de Janeiro, Sophia nasceu entre uma brincadeira de amigos, começou a trilhar seu caminho na noite carioca, até que se viu conduzindo uma pista de tribal e acumulando milhares de plays no Soundcloud e por isso, a drag DJ merece destaque em nosso Pride Month.
“A Sophia surgiu na minha vida meio que do nada. Eu, mesmo sendo um homem gay, por ser cis, acabava por ter receio de colocar em prática aquele estereótipo de toda ‘criança viada’ acabar se vestindo de mulher e gostar. Meus amigos sempre quiseram experimentar a arte da ‘montação’, até que em uma festa de Halloween, resolvi engolir meus próprios preconceitos e encarar a brincadeira.”
A primeira montação de Bruno, prestes a criar sua personagem, foi bem amadora, realmente para experimentar, mas mal sabia ele que seria o início de um futuro com muita cor, badalação e claro, música eletrônica.
“Eu e meus amigos compramos perucas daquelas bem vagabundas, umas roupas bem fuleiras, mas nos montamos, com a cara e coragem e posso dizer: foi horrível, péssimo, mas eu tomei gosto pela coisa. Já com o preconceito rasgado e jogado no lixo, percebi que eu gostava de assumir aquela figura feminina. Eu me sentia uma outra pessoa. Eu conseguia realizar aquela vontade que toda criança afeminada tem, de tornar-se uma mulher, mesmo que temporariamente. Eu realizei um sonho com a Sophia.”
Assim como para muitas pessoas LGBTQIA+, “sair do armário” é algo complicado, mas Bruno precisou fazer isso duas vezes, afinal, era preciso assumir para sua família a existência da Sophia.
“Eu lembro que comecei a me transformar na Sophia em outubro, escondido dos meus pais, até que no começo do ano seguinte, tornou-se algo corriqueiro. Assim como eu precisei criar um respeito pela minha drag, meus pais aprenderam a respeitar, admirar e até mesmo a acompanhar. De vez em quando até me acompanham em alguns shows.”
Mas nem tudo são flores e enquanto para alguns, ter os pais apoiando o trabalho da Sophia hoje, parece ter sido algo natural, no fundo não foi bem assim. Enquanto a mãe aceitava o filho como ele era, o pai de Bruno não via a situação com os mesmos olhos.
“O processo de aceitação, seja o fato da minha sexualidade quanto a existência da Sophia, por parte da minha mãe sempre foi tranquilo. Ela sempre deixou claro que queria que eu fosse feliz e fizesse o que tivesse vontade, sem precisar de ninguém, mas com meu pai a coisa não foi tão simples. Ele não digeriu muito bem e precisou de um tempo para processar a informação. Até mesmo a Sophia, quando ele percebeu que ela também era meu trabalho, aceitou melhor a personagem.”
Foi preciso desmistificar para seu próprio pai, de que a Sophia Mel não era uma garota de programa, mostrando que a figura feminina assumida por Bruno era uma “recepcionista de balada” e que era um trabalho digno como qualquer outro. Foi ali que o relacionamento da música começou.
“Eu comecei como hostess e presença VIP em uma balada do Rio de Janeiro, a Papa G e um dos produtores da casa, o Thiago Araújo, viu um potencial em mim, afinal, eu estava na casa pelo menos todas as quintas-feiras e ele sugeriu que eu me tornasse DJ, mas naquela época, de pop e funk. O pontapé foi ali.”
É muito comum que amigos ajudem no processo de migração entre estilos musicais e com Sophia Mel não seria diferente. Uma fada madrinha, ou melhor, DJ madrinha apareceu na sua vida e colocou Bruno no caminho que ele trilharia: o tribal.
“Após começar com o pop e funk, eu sentei com a Bruna Strait e ela me deu as primeiras aulas, desde como manusear uma CDJ ou usar o Rekordbox. Comecei engatinhando, colocando uma coisa mais eletro pop nos meus sets, uma vibe meio Summer Eletrohits, sempre puxando para a música eletrônica, até que a mudança foi natural e aceitei meu destino de ser uma DJ de tribal.”
Ser frequentador da noite carioca também ajudou na criação do gosto musical de Bruno. Cliente assíduo da The Week, foi entre uma ida e outra no club que ele percebeu que o gosto havia mudado, de acordo com a pista que ele ficava na casa.
“A The Week do Rio sempre foi um lugar muito badalado. Todos os meus amigos frequentavam e eu acabava indo junto, mas eu sempre ficava na pista Wallpaper, dedicada ao pop e funk. Eis que entre uma passada e outra pela pista principal, a batida começou a me chamar atenção e fui ficando na pista de tribal cada vez mais. Quando percebi, era ali que a gente ficava o tempo todo.”
E o tribal entrou com tudo na vida da Sophia. Mesmo com pouco tempo de carreira oficial como artista do genero, ele já coleciona uma residência e números expressivos em seu Soundcloud, feito que muitos DJs demoram anos para conseguir.
“Depois de presenciar uma apresentação inesquecível da Anne Louise na The Week e de perceber que eu não queria fazer parte daquela ‘máfia’ da cena pop do Rio, eu fiz meu primeiro set, o ‘Forró das Angels‘ e logo de cara foi um tremendo sucesso. Com quase 20 mil plays no Soundcloud, consegui em menos de um ano, ganhar um certo destaque na cena tribal carioca. As pessoas querem me ouvir e apreciar meu trabalho.”
Como todo o restante do mundo, Sophia se viu no meio da pandemia e a carreira que já era curta, precisou ficar em standby até que os eventos retornem com força total. O recomeço promete ser grandioso, assim como sua ambição.
“Após migrar do pop para o tribal, eu quero focar bastante na minha drag, quero me especializar ainda mais no tribal. Assim como tantos outros artistas, quero poder levar meu nome por todos os cantos do país e elevar ainda mais a arte drag. O céu é o limite!”
https://soundcloud.com/sophia-mel-147109134/forro-das-angels-liveset-tribal