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Entrevista

Entrevistamos: ZOMERO

De residência em festas digitais a uma gig no Warung, o Templo da música eletrônica. Hoje, conversamos com o DJ e Produtor ZOMERO. Confira!

Foto: Fernando Sigma

Ele começou sua carreira em meio ao caos da pandemia, foi residente de festas digitais, participou do Warung School, tocou no Templo da música eletrônica, além de já ter transitado entre diversos gêneros musicais, até encontrar o seu. ZOMERO é um daqueles artistas que traz em sua essência, a vontade de vencer, sem deixar de lado seu orgulho, que ele traz para mais uma entrevista especial do Pride Month. Entrevistamos: ZOMERO

Beat for Beat – Obrigado por conversar com a gente! Você é um arquiteto que em 2019, realizou seu sonho de 20 anos. O que causou essa mudança de chave depois de tanto tempo? O que impedia que o ZOMERO de surgir?

ZOMERO – Primeiramente, eu quem agradeço o convite ! Acredito que um pouco de auto-confiança/conhecimento, e pessoas próximas apoiando uma mudança grande na vida. Em 2019 comecei um novo ciclo que queria tudo novo para minha vida e isso incluía começar uma carreira de DJ que sempre tinha imaginado. Naquele momento, por mais que eu frequentasse diversas festas e festivais, eu mal sabia as nuances do mercado musical. Hoje tenho diversas pessoas ao meu lado me apoiando e a cada dia aprendendo e trabalhando para a cena.

B4B – Você fala sobre um sonho antigo. Lembra como esse sonho começou? Quais suas primeiras lembranças quando falamos de música eletrônica?

ZOMERO – Por volta dos ano 2000, assim que entrei no colégio comecei a ouvir música eletrônica. Na época o que tocava na rádio e em diversos lugares eram as músicas – DJ Sammy – ‘Heaven’, Gigi D´Agostini – ‘L’Amour Toujours’, Square Heads – ‘Happy’, e Lasgo. Já dá para entender qual era o cenário na epóca. A partir deste ponto, comecei a ouvir muito mais, incluindo na faculdade, a partir de 2003, onde também um pouco do Drum’n’Bass já fazia parte da cena brasileira. Lembro dos festivais “Skol Beats” no Anhembi, e hoje conheço diversos daqueles DJs que se apresentaram, que na época eram desconhecidos para mim. Fico feliz de saber que a maioria continua com uma carreria sólida e que já troquei ideias com alguns deles.

 B4B – Você também é um artista que viu o começo da carreira afetado pela pandemia? Como foi para você, tentar reconhecimento num momento em que as pistas estavam fechadas? Quais foram suas táticas usadas durante a pandemia, para ter seu nome conhecido?

Durante a pandemia aproveitei o isolamento, e a falta de projetos de arquitetura, para focar na carreira. Transmiti diversas lives na Twitch, onde conheci diversos artistas e amigos, aprendi muito sobre tecnologia, pesquisa musical e sem dúvida me ajudou na desenvoltura em apresentações. Ganhei residência em festas digitais do Núcleo Big Fish do Ilan Kriger e promovia entrevistas e apresentações de outros DJs pela Cultura Cosmo. Neste momento também ingressei em cursos de Planejamento e Marketing pela Boreal Agency e também no Warung School onde consegui profissionalizar minha carreira.

B4B –  Suas produções transitam entre alguns gêneros. Você já lançou deep house e nu disco, house e tech house, assim como melodic house. Como é o seu processo criativo na hora de produzir e como determina que estilo irá seguir no próximo single? Como isso se reflete em seus djs set?

As produções transitaram entre gêneros pois eu estava me encontrando, onde de fato queria focar na produção e em qual gênero tocar. Hoje em dia minha pesquisa e produção está focada na House Music, e ela serve tanto para a criação dos meus DJs sets – descobrindo novos artistas e gravadoras – assim como usar algumas músicas de referência na minha produção – seja um timbre ou o arranjo.

B4B – Você já tocou naquele que é o templo da música eletrônica, o Warung. Conta pra gente como foi a sensação de estrear em um dos maiores clubs do mundo. Como surgiu o convite?

Foi um conjunto de emoções desde o anúncio até o fim daquele dia. Eu ingressei no Warung School e cada masterclass possuia um desafio, e os ganhadores tinham a possibilidade de lançar uma track, ou  tocar no templo. Eu ganhei um dos concursos e fiz uma apresentação B2B com a Dani Ebner, também ganhadora. Foi incrível mesmo, e ainda toquei uma track autoral, que será lançada pelo próprio selo do clube! Arrepio só de lembrar quando vi meu nome no flyer, e dos sentimentos ao subir no ‘inside’. Essas emoções aumentam ao lembrar do acidente que o clube sofreu esse ano, mas com confiança que o Templo logo retornará. E em toda essa emoção também está o cuidado e carinho de toda a equipe do clube, do começo ao fim.

O seu projeto, Zomero & Friends, está ganhando cada vez mais destaque. Quais são os próximos passos do projeto? O que pode nos adiantar entre atrações, locais e datas? 

A produção para a quarta edição da Z&F já começou. Estou muito feliz com este projeto que tem como objetivo unir amigos, amigos dos amigos, ouvindo muita música e aproveitando o espaço, mostrando que música eletrônica não precisar ser consumida apenas em grandes clubs ou festivais. O que posso adiantar para a próxima edição é que estou procurando um lugar para uma “sunset”, seguindo o pedido do público que quer aproveitar um pouco mais do dia para se divertir. A previsão é para o mês de setembro, então fiquem ligados nas redes sociais.

ZOMERO no Warung

Recentemente vimos uma publicação sua, demonstrando amor ao seu parceiro, no dia dos namorados. Você se sente confortável em falar sobre um relacionamento homo afetivo? Já sentiu alguma forma de preconceito, por ser um artista gay? 

Por ele ser muito companheiro e apoiar toda minha trajetória, me sinto confortável sim e diretamente nunca senti algum preconceito, mas sabemos infelizmente que ele existe. É triste ver na cena eletrônica que surgiu entre a população queer, preta, latina. Não entra na minha cabeça o porquê de uma pessoa se preocupar com a a orientação sexual da outra, a ponto de cometer atos terríveis. 2023 ainda temos muito que conversar e ensinar sobre respeito, mas não podemos parar nem desistir.

– Para finalizar, o segundo semestre está começando. O que o ZOMERO tem preparado para o restante de 2023? Músicas? Gigs importantes? Obrigado

Estou planejando diversas novidades para o segundo semestre e que não poderei dar o spoiler agora, mas posso garantir que o foco na produção musical trará muita música para vocês. Um pequeno spoiler é que estou finalizando uma track, com a mixagem e masterização por Dudu Marote, com vocal autoral onde a mensagem diz muito sobre o meu projeto e minha forma de ver a vida. Muito obrigado pelo papo e nos vemos nas pistas!

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Entrevista

Entrevistamos: FUGAZ

Eles começaram o projeto durante a pandemia e hoje viajam o país levando sua sonoridade plural. Conversamos com o duo Fugaz.

De frequentadores do Club 88 a parceiros da vida pessoal e profissional. De performes de festas digitais na pandemia, a uma agenda com tour passando por diversas cidades do Brasil. Rafael e Rica são as pessoas por trás do projeto Fugaz. Com sua sonoridade passeando por diversas vertentes e carregando a imagem queer com muito orgulho, conversamos com a dupla de Campinas, que alcança cada vez mais, lugares de destaque na cena underground.

Beat for Beat – Olá, meninos, tudo bem? Obrigado por conversarem com a gente. Para começar, queremos saber: como vocês se conheceram? Sabemos que foi no Club 88, mas como foi o primeiro encontro? Quem deu o primeiro passo? Nos deem detalhes sórdidos.

Rafael – Em 2018, a gente trocou olhares no Club 88, nos apresentamos por meio de amigos e ficou por isso mesmo. Na época, eu namorava. Daí depois, a gente se encontrou no Carnaval em São Paulo e acabou dando um beijo triplo no bloquinho com meu ex. Mais sórdido que isso? Impossível! (risos).

Rica – Um tempo depois, o Rafa terminou o namoro e eu mandei mensagem assim que fiquei sabendo. Daí, a gente começou a sair, mas acabamos ficando amigos por um tempão ainda. Só começamos a namorar mesmo no final de 2020. O engraçado é que o ex dele, o Pedro Camargo, hoje em dia é nosso melhor amigo e já curtiu a maioria das gigs do Fugaz com a gente. Ele até aprendeu a tocar com a gente nesse meio tempo!

B4B – Vocês iniciaram a carreira em meio ao caos de 2020 e a pandemia. Como fizeram para serem vistos, num momento de isolamento total? Como era tentar fazer todos entenderem, apenas de forma virtual, a ideia que queriam transmitir?

Rafael – Na minha opinião, se não fosse a pandemia, o Fugaz não existiria. Foi nesse momento de isolamento que a gente se pegou pensando: meu Deus, o que estou fazendo da minha vida? A gente saiu do automático ali. A pandemia despertou uma necessidade tremenda da gente se comunicar com o mundo e levar nossa mensagem de liberdade, amor, pertencimento e poder de diversidade para a nossa comunidade. A gente começou a fazer fotografias, vídeos artísticos, crônicas e até podcasts nas nossas redes.

Rica – Depois, tivemos a oportunidade de expressar nossa visão artística durante o auge das festas virtuais. Nosso maior parceiro criativo, o Fujimiro, observou nosso movimento nas redes sociais e nos convidou para performar na festa virtual do Club 88. Investimos muita energia neste projeto, criando apresentações que mesclavam figurinos marcantes com projeções criativas sob uma seleção de músicas emocionantes pra gente. Depois disso, o projeto só cresceu: começamos a estudar discotecagem, produção musical, performance e a produzir novos tipos de conteúdos para as redes sociais.

Rafael – E se você parar para pensar: a gente apenas continuou a fazer tudo isso até hoje.

B4B – Vocês citam um estilo que incorpora diversos gêneros, como disco, acid, house e suas nuances. Como funciona o processo criativo de vocês na hora de construir um set? Como vocês definem o mood que dará o tom das suas apresentações?

Rafael – A gente busca visitar uma série de referências nossas, tanto do passado quanto do presente. Fazemos muitas temporadas de pesquisas nos estilos em que queremos trabalhar, principalmente diante de gigs importantes. Depois, apresentamos essas pesquisas um para o outro e decidimos o que faz sentido ou o que ficará para uma próxima. A gente gosta de levar mais de 300 tracks por gig e construímos essa apresentação para o público numa progressão melódica com mixagem harmônica iniciando em Abm e terminando em E.

Rica – O clima das apresentações varia de acordo com as circunstâncias da pista e as propostas espontâneas de cada evento, mas sempre preservamos nossa essência como prioridade.

B4B – Outra coisa que vocês carregam, é a identidade queer. Sendo um casal de homens gays, isso já dificultou que fossem contratados por alguma festa, causou desconforto ou até mesmo preconceito na nossa cena?

Rafael – Diretamente, não. Indiretamente, sim, principalmente quando pensamos em diversidade na música eletrônica e do que realmente é urgente. Muitos produtores são excludentes ao determinar os line ups. Não se importam com a composição final. Infelizmente, é comum nos depararmos com line ups 100% brancos, ou 100% masculino, ou 100% cis, ou 100% hétero, principalmente em eventos mainstream.

Rica – É muito contraditória essa situação de desigualdade nos line ups já que a história da música eletrônica sempre foi pautada na diversidade. Este espaço nasceu na comunidade LGBTQIAP+, na comunidade preta e na resistência dos corpos positivos.

Queremos ver mais artistas como estes explodindo, tendo sucesso, alcançando espaços cada vez maiores na cena que sempre pertenceu a eles/elas/elus.

B4B – Vocês já passaram por diversas cidades do país, o que para uma carreira tão nova, é algo louvável. Vocês esperavam que tudo acontecesse de forma tão rápida? Como vocês fazem para manter a cabeça no lugar e não se deixarem levar por esse momento de ascensão? 

Rafael – Só de ler essa pergunta minha cabeça já saiu do lugar (risos). São quase 3 anos em que nos dedicamos todos os dias para o Fugaz. Nossas conquistas são frutos disso. A gente perdeu um pouco a dimensão do que é rápido ou devagar, principalmente numa cultura imediatista como a que vivemos hoje. Pensamos que estamos no tempo certo. E tomamos muito cuidado para não dar o passo maior que a perna.

Rica – Queremos entrar nas festas que estamos prontos para participar. Não queremos tocar num lugar apenas para contar a história. Queremos tocar nos lugares para voltar para eles e tocar lá muitas vezes. Esse sim é o maior indicador de sucesso pra gente, ser convidado novamente é a maior métrica de que estamos no caminho certo. A consistência do nosso projeto e a satisfação do público é a nossa maior motivação.

Rafael – E ah, para manter a cabeça no lugar: terapia, exercícios físicos e cuidados com a saúde são prioridades na nossa rotina.

B4B – Vocês recentemente começaram a trilhar o caminho da produção musical e em seu EP ‘Me Gusta’, possuem um remix de L_cio e Érica. Contem pra gente um pouco do processo criativo desse material e o motivo da escolha desses dois nomes para fazerem suas versões para ‘Morfina’.

Rica – O EP nasceu em uma fase em que eu estava surtado com meu trabalho formal. Eu me sentia preso, tendo que me encaixar num espaço em que eu não cabia, extremamente retrógrado e conservador. A única forma de me tirar daquele estresse era produzir no Ableton, criar as tracks. Foi aí que uma das tracks do EP Calabouço ganhou força e nasceu então a Morfina. Esse nome nasce como válvula de escape para “esquecer” as dores e ansiedades geradas pelo sistema capitalista, em que o lucro está acima da vida.

Rafael – Conhecemos o L_cio num dia incrível: foi no boiler room da Valentina Luz. A gente comentou com ele que ele era uma baita referência para nossas produções e ele ficou mega curioso para escutar nosso projeto. Naturalmente a coisa fluiu: ele animou de fazer um remix pra gente e deu a ideia da Érica compor os vocais. A gente já tocava as músicas dela e adoramos a ideia. E o resultado tá aí nas pistas!

B4B – Vocês estão preparando o lançamento de ‘Suit Vit’, que celebrará a individualidade, diversidade e o poder de se expressar por meio da arte. O que podemos esperar da sonoridade dessa música? Como foi todo o processo de criação?

Rica – A sonoridade dessa faixa é uma fusão de elementos de techno, electro house e tribal house dos anos 90. Ela busca recriar a atmosfera musical daquela época a partir do ponto de vista do pioneiro produtor musical londrino Tony de Vit.

Rafael – Nós escolhemos retratar a visão dele pois ele simboliza muito para nós, com seu estilo de house reto e marcante, Tony foi um representante da comunidade Queer que lutou contra o vírus do HIV e acabou falecendo devido à complicações da Aids. Nossa música tem a missão de tornar o espírito de Tony vivo até hoje, como um necessário símbolo de resistência artística na nossa comunidade, principalmente nas pistas de dança.

B4B – Além de um duo no palco, vocês são um casal na vida real. Como é viver ao lado da pessoa que também é seu companheiro de trabalho? Vocês divergem muito na hora de produzir e pensar no projeto? Como separam a vida profissional da pessoal?

Rica – Buscamos ter nosso momento de casal, mas as vezes é inevitável. O curtir um festival, por exemplo, de repente vira um trabalho: quando você percebe já está encontrando vários colegas de trabalho e até conversando a respeito. Vivenciamos outras atividades e ambientes, como viajar, sair para jantar, beber vinho com os amigos, conhecer novas pessoas, novos boys, por aí vai… Fugaz faz parte do nosso romance e afinal, ele está com a gente sempre, a todo o momento.

Rafael – A noite mudou para sempre pra gente. Sair para relaxar é uma coisa de outra vida, parece. É difícil fazer estas distinções todas porque somos um todo. Hoje em dia temos sempre uma pressão para se relacionar ou para demonstrar uma imagem positiva. Nesse sentido, é ótimo ter alguém ao lado para compartilhar tudo isso pois a gente se ajuda muito com essas responsabilidades (e nos ajudamos quando precisamos ser irresponsáveis também)! Inclusive, esta parceria reverbera muito nas nossas decisões artísticas: a gente costuma concordar em boa parte do direcionamento do nosso projeto.

B4B – Por fim, queremos saber do futuro. Além do single que já está encaminhado, o que vocês possuem na manga do FUGAZ? Que surpresas podem nos adiantar? Obrigado pela entrevista!

Fugaz – A gente pode revelar pouquíssima coisa por enquanto! Mas podemos adiantar: datas em festas incríveis e que amamos no Rio de Janeiro, Brasília e Curitiba. E também nossas curadorias em Campinas estão finalmente pegando fogo. Quem estiver por perto, verá!

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Editorial

Biel Lima, artista que quer resgatar as raízes da house music preta

Cantor, compositor, produtor, beat maker e pessoa lendária na cena ballrom, Biel Lima conversou com nossa redação sobre sua carreira. Confira!

Preto, gay, da periferia, Biel Lima é aquele tipo de artista que precisa batalhar para sobreviver, seja da sua arte ou simplesmente no dia a dia. Considerado uma pessoa lendária na cena ballroom, ele é cantor, compositor, produtor e beat maker. Um artista completo, que encontrou na house music um refúgio e motivo para querer ir além.

Fazendo parte das comemorações do nosso Pride Month, conversamos com Biel Lima, que nos contou sobre a decisão de produzir musicalmente, sobre suas dificuldades, a cena house music e seu relacionamento com a comunidade ballrom. Confira nossa entrevista exclusiva.

Beat for Beat – Você é um artista que recentemente decidiu fazer o caminha inverso de muitos da cena eletrônica e já ir para a produção musical. O que te trouxe para esse caminho?

Biel Lima – Eu acredito que a minha própria carreira musical me trouxe para a produção de música eletrônica. Eu decidi ser cantor cerca de vinte anos atrás, quando comecei no rap, rnb, até que me apaixonei pela house music e a música eletrônica como um todo. Foi então que percebi que na quebrada, nas periferias, pessoas pretas não tem o hábito de produzir música eletrônica.

Claro que temos algumas pessoas que saíram das quebradas tocando música eletrônica, como o grandioso DJ Marky, que construiu um legado no Drum’n’Bass, mas maioria das pessoas acabam produzindo um outro tipo de música eletrônica, que é o o funk, por exemplo. Como outros gêneros não são tão difundidos, como a house music, por isso decidi enveredar por esse caminho.

B4B – Você, sendo da quebrada, da periferia, onde não existe o hábito de consumir a música eletrônica, como chegou até ela?

Biel Lima – Foi a house music especificamente que me trouxe para esse mundo, principalmente por conta das divas. Tony Braxton, por exemplo, que sempre teve remixes com essa pegada mais Chicago. Quando comecei a entender o que é era House Music, acabei me apaixonando ainda mais, pois percebi que assim como o hip hop, entre muitas outras culturas, como jazz, a house music veio da quebrada, de pessoas pretas. Descobrindo isso, decidi que era o que eu queria fazer, assim como o Rnb.

B4B – E quando falamos da criação da house music, você começar a produzir, é uma forma de se reapropriar daquilo que é seu. Você acha que a música eletrônica tornou-se heteronormativa cis branca?

Biel Lima – Completamente e não só a música eletrônica,  mas como muitas outras coisas. O rock, por exemplo, também veio de uma mulher preta, a Rosetta Tharpe. O jazz começou com instrumentos de música clássica reciclados, improvisados, por pessoas pretas que não tinham dinheiro… A música eletrônica também veio daí, e quero realmente reviver essas raízes, me apegando mesmo no que é passado.

Eu tenho um projeto chamado ‘House é Som de Preto’. Eu quero transformar isso em um show pra reafirmar cada vez mais da onde veio e o que é essa música que tanto faz a cabeça da galera nesses grandes festivais.

B4B – Além de ser cantor, produtor musical, você também faz parte da comunidade Ballroom. Quando foi que essa filosofia de vida entrou na sua?

Biel Lima – A ballroom entrou na minha vida em um momento que eu nem percebi. Eu danço também e acredito que a ballroom, e até mesmo a house music, chegaram até mim através da dança. Descobri house dance, obviamente por conta da house music. Essa musicalidade tem muito soul, muito instrumento vivo e dentro da house dance, descobri o voguing, que é um estilo de dança que tá dentro da comunidade Ballroom e aí eu descobri que existe também a vertente do vogue beat, isso lá em 2010 aproximadamente. Eu não sabia os nomes, não conhecia nada, só tentava reproduzir os movimentos.

Em meados de 2013 eu conheci o Félix Pimenta, que é pioneiro da comunidade ballroom, meu grande amigo, meu irmão. Ele me mostrou como era fazer parte de um movimento que virou uma cultura que é muito similar ao hip hop. Passei a entender melhor sobre as casas, entendi que tem um chanter, commentators, mergulhei e estudei sobre aquilo.

Em 2014 eu comecei realmente a viver a comunidade ballroom e tentar me afirmar cada vez mais como um uma pessoa que faz parte dessa comunidade e que fomenta a comunidade de um certo modo.

B4B – E você pretende levar sua formação como produtor musical para dentro da ballroom?

Biel Lima – Sem dúvida alguma, porque é uma cena que ainda tá muito carente de meios de produção. A comunidade ballrom também vem das periferias. Mesmo que as grandes balls aconteçam no centro da cidade, as pessoas saem das quebradas para realizares suas apresentações e para essa comunidade tentar viver, precisamos cada vez mais pessoas que estão pensando em meios de produção, em fazer acontecer e pra fazer acontecer a ball, a gente precisa de uma mínima estrutura possível. Cada vez mais, queremos trazer coisas que são concebidas aqui no Brasil, como a música.

Nós consumimos dos gringos de Nova Iorque, por exemplo, seja em musicalidade ou referências. Hoje, aqui no Brasil, a gente já tem várias Femme Queens referências, como a Zaila. Nós precisamos, cada vez mais, tentar trazer essas pessoas para lugares de protagonismo, para que saibam que a pessoa existe e que não é só Pose, Legendary, que isso só vai ser visto lá fora nos Estados Unidos. Aqui existe nossa cultura e ela precisa ser vista.

Muita gente não conhece a nossa cena, nossos artistas, pois muitas empresas e marcas só lembram de nós quando precisam, mas tem muita gente fazendo coisa aí todos os dias e eu quero ser um um produtor, não só um produtor cultural, mas um produtor artístico, um produtor musical que vai produzir vogue beat e que vai trazer também no meu show, essa linguagem ballroom.

B4B – Você fala sobre a comunidade ballrom não ter pessoas que possuam os meios de produção e quando isso se vira para você, ser preto, gay, da periferia, te prejudicou na hora de achar alguém para trabalhar junto?

Biel Lima – Total, eu comecei no rap, na Bela Vista, em 2007 , num momento em que as pessoas não estavam discutindo sobre identidade de gênero, sexualidade, até tinham algumas discussões em alguns polos que são muito menos acessados. Hoje falamos mais sobre isso, a gente discute mais sobre isso, tá mais latente do que antes, mas foi muito difícil.

Na verdade é difícil até hoje. Eu trabalho em um restaurante ainda, porque eu não consigo me estabelecer como um artista preto, gay, que veio da quebrada e que não tem dinheiro pra se manter só da música. Eu acabo competindo também com essa indústria que escolhe um tipo de corpo, coloca num estereótipo e acaba que só alguns tipos de pessoas conseguem ter oportunidades.

Mas assim como eu, tem muitos outros que estão lutando para poderem fazer um show, para produzirem. A minha intenção principal, fazendo meus cursos, me profissionalizando, seja como produtor musical ou na área de marketing, que também estou estudando, é para subverter isso e poder ajudar pessoas que estão no corre, assim como eu.

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Editorial

Mais um mês de junho. Mais um mês para ter Orgulho, e temos!

O mês de junho, onde comemora-se o Orgulho LGBTQIA+, é motivo para ser celebrado, ainda mais por pessoas da nossa comunidade.

Não faz tanto tempo assim, ainda era tabu falar sobre o Orgulho LGBTQIA+ e com propriedade podemos dizer isso, pois vivemos essa época. Parece uma ideia arcaica não poder falar do assunto, mas cerca de 10 anos atrás, o mundo era outro, a cabeça das pessoas era outra e mesmo que pouco a pouco, isso está mudando, e assim seguiremos.

Diferente de muitas marcas, empresas e até mesmo portais, que lembram da comunidade LGBTQIA+ apenas durante o mês de junho, desde sua criação, o Beat for Beat tem esse compromisso com essas pessoas. Um dos motivos é simples: a música eletrônica nasceu preta, periférica e gay. É nosso dever e obrigação, resgatar as raízes daquilo que nos nutre e movimenta.

O outro motivo é mais simples ainda: os editores do B4B são homens gays. São e sempre foram. Faria algum sentido eles, como seres pertencentes de uma minoria, a mesma que deu origem a tudo que escrevemos aqui, não falarem sobre a comunidade a qual pertencem? Não só em junho, mas durante todo o ano, nosso time se esforça para explorar artistas LGBTQIA+. Mas em junho é diferente.

Nosso espaço sempre esteve aberto a todos os tipos de pessoas, LGBTQIA+ ou não e nunca fizemos distinção entre as pessoas na hora de fazer uma postagem. Mas em junho, para celebrar o orgulho que temos, o espaço é ampliado, priorizado. Durante o mês de junho, nossa comunidade ganha ainda mais voz, em um espaço que já ocupam. É preciso virar os holofotes para quem precisa de mais luz.

Seguindo com nossa tradição anual, essa carta abre os trabalhos de nosso Pride Month. Durante as próximas semanas, vocês conhecerão artistas novos, lerão conteúdos de artistas consolidados, poderão ter contato com diversos artistas da nossa comunidade e que destacam-se não apenas por serem LGBTQIA+, mas por serem pessoas incriveís. Acompanhem aqui e no Instagram.

Convidamos vocês a celebrarem com a gente. Tenha Orgulho de ser LGBTQIA+ ou de ser um aliado. Não ser contra nós, já te faz uma pessoa melhor.

Feliz Mês do Orgulho!

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Editorial

Sophia Mel, a drag que nasceu ao acaso, mas que pertence ao Tribal

Da primeira montação de brincadeira para hostess de balada, sets e pop e funk, até migrar pro tribal. Conheça a drag DJ Sophia Mel.

De dia, Dr. Bruno Avelino. De noite, Sophia Mel. Artista do Rio de Janeiro, Sophia nasceu entre uma brincadeira de amigos, começou a trilhar seu caminho na noite carioca, até que se viu conduzindo uma pista de tribal e acumulando milhares de plays no Soundcloud e por isso, a drag DJ merece destaque em nosso Pride Month.

A Sophia surgiu na minha vida meio que do nada. Eu, mesmo sendo um homem gay, por ser cis, acabava por ter receio de colocar em prática aquele estereótipo de toda ‘criança viada’ acabar se vestindo de mulher e gostar. Meus amigos sempre quiseram experimentar a arte da ‘montação’, até que em uma festa de Halloween, resolvi engolir meus próprios preconceitos e encarar a brincadeira.

A primeira montação de Bruno, prestes a criar sua personagem, foi bem amadora, realmente para experimentar, mas mal sabia ele que seria o início de um futuro com muita cor, badalação e claro, música eletrônica.

Eu e meus amigos compramos perucas daquelas bem vagabundas, umas roupas bem fuleiras, mas nos montamos, com a cara e coragem e posso dizer: foi horrível, péssimo, mas eu tomei gosto pela coisa. Já com o preconceito rasgado e jogado no lixo, percebi que eu gostava de assumir aquela figura feminina. Eu me sentia uma outra pessoa. Eu conseguia realizar aquela vontade que toda criança afeminada tem, de tornar-se uma mulher, mesmo que temporariamente. Eu realizei um sonho com a Sophia.

Sophia Mel em 2018

Assim como para muitas pessoas LGBTQIA+, “sair do armário” é algo complicado, mas Bruno precisou fazer isso duas vezes, afinal, era preciso assumir para sua família a existência da Sophia.

Eu lembro que comecei a me transformar na Sophia em outubro, escondido dos meus pais, até que no começo do ano seguinte, tornou-se algo corriqueiro. Assim como eu precisei criar um respeito pela minha drag, meus pais aprenderam a respeitar, admirar e até mesmo a acompanhar. De vez em quando até me acompanham em alguns shows.

Mas nem tudo são flores e enquanto para alguns, ter os pais apoiando o trabalho da Sophia hoje, parece ter sido algo natural, no fundo não foi bem assim. Enquanto a mãe aceitava o filho como ele era, o pai de Bruno não via a situação com os mesmos olhos.

O processo de aceitação, seja o fato da minha sexualidade quanto a existência da Sophia, por parte da minha mãe sempre foi tranquilo. Ela sempre deixou claro que queria que eu fosse feliz e fizesse o que tivesse vontade, sem precisar de ninguém, mas com meu pai a coisa não foi tão simples. Ele não digeriu muito bem e precisou de um tempo para processar a informação. Até mesmo a Sophia, quando ele percebeu que ela também era meu trabalho, aceitou melhor a personagem.

Foi preciso desmistificar para seu próprio pai, de que a Sophia Mel não era uma garota de programa, mostrando que a figura feminina assumida por Bruno era uma “recepcionista de balada” e que era um trabalho digno como qualquer outro. Foi ali que o relacionamento da música começou.

Eu comecei como hostess e presença VIP em uma balada do Rio de Janeiro, a Papa G e um dos produtores da casa, o Thiago Araújo, viu um potencial em mim, afinal, eu estava na casa pelo menos todas as quintas-feiras e ele sugeriu que eu me tornasse DJ, mas naquela época, de pop e funk. O pontapé foi ali.

É muito comum que amigos ajudem no processo de migração entre estilos musicais e com Sophia Mel não seria diferente. Uma fada madrinha, ou melhor, DJ madrinha apareceu na sua vida e colocou Bruno no caminho que ele trilharia: o tribal.

Após começar com o pop e funk, eu sentei com a Bruna Strait e ela me deu as primeiras aulas, desde como manusear uma CDJ ou usar o Rekordbox. Comecei engatinhando, colocando uma coisa mais eletro pop nos meus sets, uma vibe meio Summer Eletrohits, sempre puxando para a música eletrônica, até que a mudança foi natural e aceitei meu destino de ser uma DJ de tribal.

Ser frequentador da noite carioca também ajudou na criação do gosto musical de Bruno. Cliente assíduo da The Week, foi entre uma ida e outra no club que ele percebeu que o gosto havia mudado, de acordo com a pista que ele ficava na casa.

A The Week do Rio sempre foi um lugar muito badalado. Todos os meus amigos frequentavam e eu acabava indo junto, mas eu sempre ficava na pista Wallpaper, dedicada ao pop e funk. Eis que entre uma passada e outra pela pista principal, a batida começou a me chamar atenção e fui ficando na pista de tribal cada vez mais. Quando percebi, era ali que a gente ficava o tempo todo.

E o tribal entrou com tudo na vida da Sophia. Mesmo com pouco tempo de carreira oficial como artista do genero, ele já coleciona uma residência e números expressivos em seu Soundcloud, feito que muitos DJs demoram anos para conseguir.

Depois de presenciar uma apresentação inesquecível da Anne Louise na The Week e de perceber que eu não queria fazer parte daquela ‘máfia’ da cena pop do Rio, eu fiz meu primeiro set, o ‘Forró das Angels‘ e logo de cara foi um tremendo sucesso. Com quase 20 mil plays no Soundcloud, consegui em menos de um ano, ganhar um certo destaque na cena tribal carioca. As pessoas querem me ouvir e apreciar meu trabalho.

Como todo o restante do mundo, Sophia se viu no meio da pandemia e a carreira que já era curta, precisou ficar em standby até que os eventos retornem com força total. O recomeço promete ser grandioso, assim como sua ambição.

Após migrar do pop para o tribal, eu quero focar bastante na minha drag, quero me especializar ainda mais no tribal. Assim como tantos outros artistas, quero poder levar meu nome por todos os cantos do país e elevar ainda mais a arte drag. O céu é o limite!

https://soundcloud.com/sophia-mel-147109134/forro-das-angels-liveset-tribal

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Editorial

Alphenkka: do rock ao forest, até descobrir sua real identidade musical

Do rock ao electro; do electro ao psytrance; do psytrance ao forest. Conheça a trajetória de Alphenkka, novo personagem do Pride Month.

Estamos cansados de dizer que o psytrance é uma das cenas mais libertárias que existem na música eletrônica e talvez seja por isso, que é muito comum encontrar pessoas que sentem-se a vontade em assumir que fazem parte da comunidade LGBTQIA+, como é o caso de Alphenkka, projeto de Kauê Garcilasso, que começa nosso papo relembrando suas primeiras memórias musicais.

Quando paro pra pensar na minha primeira lembrança musical, volto lá pra minha infância. Meu pai amava escutar música brasileira e uma das bandas preferidas dele era o Capital Inicial. Ele gostava muito, de ouvir sempre e por muito tempo, eu ouvi o álbum acústico da banda inteiro. Eu sabia todas as letras de todas as músicas.

Nem só de rock vive o homem e Alphenkka também lembra, com muito carinho, de outro contato com a música, ainda na infância, mas dessa vez ligado ao seu avô e às suas raízes sulistas, já que tanto o pai quando o avô, nasceram no Rio Grande do Sul

Outra lembrança muito forte que tenho é do meu avô colocando discos de vinil pra tocar, todos de música tradicional gaúcha. Não lembro bem qual gênero era, mas era muito característico da região e sempre que eu estava na casa deles, a vitrola não parava de tocar e o regionalismo se fazia presente em forma musical.

Kaue na Terra Viva

Por incrível que pareça, tanto o rock do Capital Inicial, quanto a música tradicional gaúcha, não foram o estopim para que Alphenkka tivesse aquela vontade de se envolver profissionalmente com o ramo musical. Foi preciso conhecer um amigo da sua irmã, na época de colégio, para ter uma nova visão sobre o mundo que o aguardava.

Eu não tive muito aquela fase de começar num estilo e depois migrar para a música eletrônica. Desde os meus 14 anos, tive contato com o electro através de um amigo de escola da minha irmã, que me apresentou o duo Electrixx, muito famoso naquela época. Nós saímos da escola e íamos pra minha casa ouvir aquele som ‘foda’. Foi com esse amigo da minha irmã que acabei conhecendo alguns outros artistas, comecei a descobrir as vertentes da música eletrônica e tive vontade de querer ir além.

Mais uma vez o destino falha e Alphenkka, mesmo começando no electro e vertentes mais comerciais, não chegou a frequentar eventos do tipo, até por conta da idade. Foi preciso aguardar alguns anos para ter seu primeiro contato com as festas e então, mudar completamente seu foco musical.

Foi no ano de 2013 que fui para meu primeiro rolê, nada a ver com aquela música eletrônica que eu havia conhecido. Fui na Trance in Moon, sozinho, já que meus amigos estavam completamente sem grana. Eu sabia que não poderia deixar aquela oportunidade passar e mesmo lutando contra a minha timidez, ‘meti o louco’ e fui com a cara e coragem.

Kaue na Gaia Connection

Encarando a sua primeira festa na vida, Alphenkka estava sozinho, porém rodeado de pessoas e foi ali, na excursão mesmo, a caminho da festa, que ele começou a se enturmar e criar novos laços. Era o início da sua história com o psytrance.

Durante o trajeto para a festa, acabei me enturmando, até mesmo pela distância. A Trance in Moon aconteceu cerca de 350km de São Paulo, então tive bastante tempo para conhecer pessoas. Mesmo longe dos meus amigos, eu voltei completamente extasiado daquela experiência, que foi muito além do que havia imaginado. Foi ali que resolvi me jogar cada vez mais na cena e viver intensamente e verdadeiramente o P.L.U.R.

Mais um plotwist acontece e eis que Alphenkka se apaixona pelas vertente noturna do psytrance. Foi nos BPMs mais rápidos e batidas mais obscuras que ele encontrou seu verdadeiro eu e ali, fez morada.

Ainda na Trance in Moon eu conheci o som do DJ Goch, uma coisa completamente diferente daquilo que eu já tinha ouvido até ali. Um som mais pesado, denso, conhecido por Forest e que ficou na minha cabeça. Em 2014, resolvi me aventurar na festa Sarasvati, focada só em Forest, no som que o Goch me apresentou e foi onde escolhi a vertente que me acompanharia profissionalmente como DJ.

Da infância com rock, da iniciação eletrônica com electro, da primeira festa com psytrance até esbarrar nas vertentes noturnas como o Forest, foi em 2016 que Alphenkka começou a dar seus primeiros passos profissionais na música eletrônica, mas nem tudo foi como ele esperava.

Minha primeira experiência com um professor de discotecagem não foi nada bacana. Meu tutor não gostava de psytrance e consequentemente não me deixava treinar. Eu não podia praticar com o gênero que eu havia escolhido para tocar, até que conheci um casal, a Amanda e o Vinicius, pedindo carona para ir pra um festival e que também são DJs. Foi com esse casal que comecei a ter mais contato com o psytrance. Recebi diversas dicas deles, trocamos bastante conhecimento, até que fiz minha estreia na festa Psyconnect, em São Paulo.

Alphenkka na Psyconnect

Após dar o start oficial na sua carreira, Kauê resolve tentar mais uma vez um curso de DJ, mas dessa vez em uma escola reconhecida na cidade de São Paulo, a e-lab, que não o podou em seu sonho e o deixou viajar nas ondas do psytrance, porém, a pandemia chegou.

Em 2019 eu decidi que queria investir na minha carreira de DJ, pedi demissão do meu trabalho, peguei a grana que eu havia guardado e comecei o novo curso na e-lab. As aulas estavam indo super bem, mas a pandemia começou, em 2020, e o curso precisou ser interrompido. Com o avançar dos meses e as flexibilizações, consegui terminar as aulas, com turmas totalmente reduzidas, mas o suficiente para que eu conseguisse adquirir o conhecimento necessário.

O novo curso, na escola certa, abriu ainda mais a cabeça e os caminhos de Alphenkka, que mesmo em uma época tão delicada para todos nós, não desistiu e se aventurou nos novos formatos de apresentação e as tão faladas lives.

Acho que como muitos artistas, precisei me adaptar, ainda mais para quem está começando na carreira musical. Fiz algumas lives, toquei para amigos bem próximos e restritos, em algum sítio da família, mas não deixei o sonho acabar. Estou no começo de tudo e quero crescer muito mais.

Galera reunida na Shiva Trance

E como um artista que faz parte da comunidade LGBTQIA+, Kauê, mesmo sem nunca ter sofrido preconceito na cena, sabe que ela ainda precisa de orientação e de que mais amor.

Eu posso dizer que sou privilegiado por nunca ter vivido alguma experiência desagradável na cena, mas eu não me sinto representado. As pessoas podem se vestir como querem, ser quem quiserem, mas ainda há uma resistência muito grande, principalmente quando falamos de artistas LGBTQIA+ reconhecidamente famosos. Não existem grandes nomes que fazem parte da nossa comunidade. A Luuli, uma DJ trans, é uma das poucas que faz parte do nosso movimento. Acredito que mesmo a cena sendo totalmente libertária, ainda há um medo ou certa resistência, por parte da pessoa que quer se assumir ou do público, em aceitar uma figura importante como LGBTQIA+

Mas não adianta falar e não fazer, por isso Alphenkka é um daqueles que não fica quieto diante de algumas atitudes e como frequentador e artista, posicionar-se é a melhor solução para combater esse preconceito ainda enraizado.

É muito importante nunca ter medo de mostrar quem eu realmente sou. De ser 100% eu, sem medo de julgamento das pessoas. Eu busco sempre me posicionar, repudiar e até mesmo boicotar festas e pessoas que ainda possuem atitudes homofóbicas ou que possam ferir minha comunidade. Não dar palco para atitudes escrotas. Busco sempre também dar visibilidade para artistas LGBTQIA+ e gosto de incentivar essa visibilidade. É muito importante que sejamos unidos.

O futuro ainda é muito incerto, mas como esperança é a última que morre e Alphenkka também planeja seus próximos passos.

Uma das coisas que mais quero, quando tudo isso acabar, é poder voltar a frequentar as festas, os eventos. Sinto muita falta. Quero também continuar estudando, investindo sempre na minha carreira, começar a produzir. Como muitos artistas iniciantes, também almejo meu lugar ao sol. Vou fazer esse projeto virar!

Escute Alphenkka no Soundcloud!

Alphenkka – Ëxx.u set by Alphenkka

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Editorial

Tebetê #11: Honey Dijon no Boiler Room x Sugar Mountain 2018

Um dos sets mais icônicos de house music do Youtube, Honey Dijon no festival Sugar Mountain em 2018, pelo Boiler Room, é destaque na Tebetê.

Foto: Boiler Room

Muito antes das lives tornarem-se moda, tudo isso por conta da pandemia, a cena da música eletrônica mundial já era grande amiga das transmissões virtuais. Festivais e canais sempre fizeram essa conexão do público com seus eventos através da internet, mas o Boiler Room, um dos especialistas no assunto, sempre entregou grandes performances e hoje destacamos uma lendária e digna da coluna Tebetê.

O ano era 2018. O festival era o Sugar Mountain em Melboune, Austrália. A DJ era uma das maiores deusas da house music atual: Honey Dijon. Com transmissão especial do Boiler Room, a apresentação transformou-se na mais assistida da artista no Youtube e o 10º vídeo mais popular no canal do coletivo. Com mais de 7.5 milhões de visualizações, o set é de longe, um verdadeiro viral.

Repleto de batidas vibrantes que nos convidam para dançar, o set combina saxofone e outras texturas instrumentais com vocais emprestados de hip-hop e clássicos da house music, com direito ao marcante discurso ‘I Have a Dream‘ de Martin Luther King. A performance de Miss Honey, criando mashups ao vivo, beira a perfeição e sua alegria é contagiante. Uma dose de estímulo para os dias mais tristes.

Considerada uma das artistas LGBTQIA+ mais influentes da cena eletrônica mundial atual, Honey Dijon é um ícone de luta e resistência. Ver uma mulher trans, preta, assumindo pickups do mundo todo e com lugar destaque por onde quer que passe, é motivo de orgulho e merece ser reverenciado em nosso Pride Month. Uma verdadeira diva e que tem todo nosso carinho e admiração.

Curta abaixo o set inigualável de Honey Dijon no Boiler Room Sugar Moutain 2018, também disponível no Soundcloud e relembre esse momento histórico em nossa coluna Tebetê! O set também está

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Ga Crux, a liberdade e a transformação potencializada pelo psytrance

De uma infância com David Guetta a uma carreia focada no Full On, Ga Crux é o primeiro convidado do Pride Month 2021 do Beat for Beat.

Para muitos, o primeiro contato com a música eletrônica sempre aconteceu na rua, entre amigos ou até mesmo numa baladinha aleatória, mas para Gabriel Serracini, nome por trás do projeto Ga Crux, primeiro convidado do Pride Month 2021, a dance music veio de família, logo cedo, gênero esse que o encantaria profissionalmente e o aceitaria como ele realmente é.

A música sempre esteve presente na minha vida. Nasci numa família de músicos, então sempre estive rodeado de muita melodia, cantorias e notas musicais. Com o passar dos anos, acabei de aperfeiçoando no violão e baixo, até que fui apresentado para a música eletrônica ainda pequeno, nos anos 90, pelo meu irmão e meu primo. Mal sabia que seria o início de um longo relacionamento musical.

Assim como para muitos artistas, as influências sempre contaram muito no momento de decidir seu futuro e com Ga Crux não seria diferente. Aqueles artistas que ele conheceu, logo que descobriu a dance music, se fizeram muito importantes em seu desenvolvimento profissional e pessoal.

Comecei ouvindo aquilo que era bem popular no começo dos anos 2000. The Prodigy, Benny Benassi, David Guetta, Alex Gaudino, Lorena Simpson… mesmo não ouvindo com tanta frequência hoje, foram artistas que me fizeram ir atrás, pesquisar a música eletrônica, me aprofundar cada vez mais, até que me encontrei!

Considerada por muitos como uma das cenas mais inclusivas da música eletrônica, foi no Psytrance que Gabriel encontrou um lugar para chamar de seu. Mais uma vez por indicação de amigos próximos, ele visitou pela primeira vez a festa Gaia Connection e foi paixão à primeira vista.

Eu nunca tinha escutado as vertentes psicodélicas do trance. Comecei ouvindo Progressive Trance, até que me deparei com o Full On e me encantei. A velocidade, os elementos, a vibe transmitida, tudo me fez decidir que seria aquilo que eu gostaria de tocar e produzir. Conhecer o psytrance foi uma das melhores coisas que já aconteceram na minha vida.

E é por abraçar a todos, que a cena alternativa se mostrou tão receptiva para Ga Crux, assim como para tantas outras pessoas. Mesmo frequentando outras cenas, voltadas para a comunidade LGBTQIA+, é no psytrance que ele se sente mais à vontade.

O Tribal House, tão característico entre a minha comunidade, não me acolhe tanto quanto as festas que frequento. Seja musicalmente falando ou até mesmo pelo ambiente, me sinto muito bem quando estou entre a natureza, ao invés de clubes. Não me refiro ao público, mas a sensação de liberdade, da conexão com o verde, da comunhão com o psytrance.

Claro que não podemos ser hipócritas e dizer que é tudo maravilhoso. o preconceito, mesmo que pequeno, existirá em alguns lugares. Nem todas as pessoas estão preparadas para conviver com as diferenças, mas Gabriel também usa de sua voz como artista para transmitir mensagem de aceitação:

A cena é, em sua grande maioria, amável com todos. Você acaba criando laços que vão durar uma vida toda, mas nem tudo são flores. É preciso se posicionar sempre, onde quer que você esteja e acima de tudo, apoiar o seu igual. Usar das redes sociais para levar conhecimento ao próximo, buscar formas de conscientizar e mostrar que as diversidades existem e estão ai. Precisamos sempre cortar o mal pela raiz.

Trilhando o tão sonhado caminho do sucesso, Ga Crux está investindo na sua carreira de produção musical e apostando em sets que estão disponíveis no Soundcloud. fazendo uma rápida reflexão, ele diz a si mesmo:

Parabéns! Você está indo pelo caminho certo. Continue assim.

Odin by Ga Crux

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Editorial

Junho, um mês de orgulho e resistência com as cores da nossa bandeira

O mês de junho celebra o orgulho LGBTQIA+ e no B4B, as comemorações que antes duravam uma semana, agora serão ainda maiores.

O ano era 1969. Na cidade de Nova York, nos Estados Unidos, havia um único bar dedicado à comunidade LGBTQIA+ daquela região, o Stonewall Inn. Sem licença para comercializar bebidas e saídas de emergência, além de não seguir as exigências sanitárias da época, ali era o único lugar abertamente de NY e que tinha como seu principal atrativo a dança – nele aos frequentadores era permitido dançar.

Mesmo já funcionando anos depois da descriminalização da homossexualidade nos EUA, a comunidade ainda era muito perseguida e os frequentadores do Stonewall Inn também. Foi no dia 28 de junho, após uma batida policial, que a comunidade decidiu não se calar mais e causou o episódio que até hoje, é conhecido como um dos marcos mais importantes da comunidade LGBTQIA+ dos últimos anos: a Revolta de Stonewall. (Fonte: Hypeness)

Mas o que isso tem a ver com o Beat for Beat e com a música eletrônica? TUDO!

Revolta de Stonewall 1969

Após 1969, o mês de junho tornou-se o Mês do Orgulho LGBTQIA+. É no mês de junho que as maiores Paradas do mundo acontecem (São Paulo, Nova York, Paris, Barcelona, Londres, Roma, Tel Aviv, Sidney, Toronto, Las Vegas, entre outras)  e também, quando é celebrado o Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+, 28 de junho, em homenagem ao ato tão importante de Stonewall. No B4B não seria diferente.

Desde sua criação, em 2015, este portal celebra o orgulho, as cores da nossa bandeira, através da Pride Week. Durante alguns dias seguidos, dedicávamos parte da nossa programação para abordar temas importantes, sempre dialogando com artistas LGBTQIA+ da cena eletrônica nacional, mas este ano será diferente. A partir de 2021, o Beat for Beat realizará o Pride Month!

Durante todo o mês de junho, começando agora, traremos entrevistas com artistas nacionais e internacionais, todos pertencentes a comunidade. Teremos playlists especiais, um Beat Sessions exclusivo e colorido, tudo isso para enaltecer ainda mais os artistas que nunca se esconderam da sociedade. Que possuem orgulho de levantarem a nossa bandeira. Aos que não sabem, a redação original do Beat for Beat é composta 100% por homens gays!

Não queremos impor uma “ditadura gay”. O Pride Month quer celebrar o orgulho que sentimos e continuar oferecendo um conteúdo de qualidade, dessa vez, sob o arco-íris que nos rege. Queremos, acima de tudo, resgatar as raízes da música eletrônica, que nasceu no meio da comunidade LGBTQIA+ preta e além disso, mostrar que o respeito é bom e a gente gosta!

Feliz Mês do Orgulho!

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